segunda-feira, 24 de março de 2014

A ORIGEM DA AVERSÃO POLÍTICA BRASILEIRA

Da construída “aversão política” até a atual necessidade de conscientização de grande parte dos brasileiros.
   As eleições estão chegando, nas ruas e nos comícios nada de novo, e o fenômeno tiririca ainda está presente no imaginário inconsciente de grande parte da população; E não é nenhum exagero imaginar que nada mudará em relação às eleições anteriores, dado que as maiorias das pessoas não veem com a devida responsabilidade a validade do seu poder decisivo durante as eleições.  A inércia coletiva está pairada, e muitos eleitores e até candidatos levam na brincadeira as eleições.
  O fenômeno tiririca citado acima tem sido explicado pela mídia como uma reação dos eleitores, entretanto, tal afirmação esconde a verdadeira natureza do ocorrido, a qual o Partido Republicano orquestrou com imensa sabedoria a candidatura do nosso querido palhaço desempregado, que por sinal possui um grande carisma nacional e os seus votos conquistados trouxeram para a legenda do PR a possibilidade de colocar candidatos sem muitas chances de vitória. Se a votação, como afirmam, fosse uma voz de protesto, certamente as pessoas não votariam no tiririca, até porque quando o povo protesta de verdade, existe uma consciência política e uma organização bem articulada, e tal fato não houve. Ou seja, foi muito mais uma manobra inteligente elaborada pelos grupos hegemônicos, constituídos dentro do PR, e conscientes da atual fragilidade política que a utilizaram como uma ferramenta para o projeto de poder criado.
   Por outro lado, identificar tal fragilidade e associá-la à possível aversão política do brasileiro, me parece ser tão absurdo quanto imaginar o voto de protesto referido. A tão comentada aversão política referida não poderia encontrar eco em nossa natureza política, ou seja, não podemos esquecer que os humanos são políticos por natureza e as relações de poder atingem um universo tão dinâmico intrínsecos nas relações sociais. Portanto, eu prefiro desconfiar  que a atual chamada “aversão política” está no interior de um jogo das relações de poder construídas na formação do estado brasileiro e aprofundada durante a ditadura militar (1964-1985), que ainda apresentam efeitos merecedores da atenção de toda a sociedade organizada: escolas, igrejas,ONGs, Clubes de Serviço etc.
  Talvez não consigamos imaginar os brasileiros discutindo nos bares, nas ruas, nas escolas, nas universidades, no trabalho e etc. Se usarmos o atual quadro existente não acreditaremos que nas décadas de 40, 50 e 60 os populares se entusiasmavam com os discursos de Jânio Quadros, Carlos Lacerda, João Goulart, Leonel Brizola, João Amazonas, Miguel Arraes e Carlos Marighela e como também as lembranças de Getúlio Vargas. Os ideários dos comunistas, anarquistas e das assembleias dos sindicatos combativos eram firmes em sua ideologia. Independente do perfil ideológico presente em seus discursos tais elementos acima descritos fez dessas décadas momentos riquíssimos de nossa história política brasileira. Fizeram parte desse quadro político.
   A ditadura militar representou os interesses de grupos hegemônicos ligados ao capital estrangeiro, que não estavam dispostos a entregar o poder ao povo e muito menos estavam inclinados a realizar as reformas tão necessárias apresentadas pelo Plano Trienal do presidente João Goulart. Temas como a reforma agrária tão necessária, a reforma urbana, reforma eleitoral, a reforma tributária e a temida distribuição de riquezas propostos ainda são temas “subversivos” mesmo nos dias atuais. Os temas enchiam o povo de esperança e ao mesmo tempo assustava as classes conservadoras as quais jamais abririam mão de seus privilégios e ,sobretudo, a crescente participação política não era vista com bons olhos pelos conservadores, sendo assim uma atitude teria que ser tomada, e tal atitude, veio como uma grande resposta: O GOLPE DE 64.
  No plano individual a ditadura se valeu de várias ferramentas, elas poderiam variar conforme o perigo subversivo avaliado por eles, ou seja, cada opositor ou grupos de opositores  eram tratados de acordo com os seus atos políticos contra a ordem instaurada pelos militares e lógico que poderiam chegar ao extremo como por exemplo, a eliminação física. Escrever sobre os crimes cometidos pela ditadura me renderia aqui escrever uma coleção de livros e talvez não esgotasse palavras para descrevê-los, dado aos fartos testemunhos e documentação histórica que comprovam os atos daqueles “bárbaros”. Infelizmente nos dias atuais, apesar de tantos esforços, o Congresso Nacional limita e muito o acesso aos arquivos confidenciais daquele regime protegendo uma gama de políticos e militares associados.
   Apesar de todos os brutais crimes os efeitos da ditadura continuam existindo e se revelam na atual consciência política da maioria dos brasileiros se materializam em nossa atual atitude cívicos como eleitores. O maior legado dos militares não estão somente nos crimes, devemos observá-lo de uma forma muito ampliada, já que o papel dos militares foi neutralizar a participação política do povo brasileiro e tal situação implicou na criação de vários instrumentos as quais viabilizassem os seus projetos políticos, de maneira que foi necessário, eliminar fisicamente várias pessoas,patriotas e lutadoras, que amavam e lutaram por esta nação, ou seja, os militares e os grupos hegemônicos eliminaram fisicamente uma geração de lideranças. Nos dias atuais tais situações ecoam em nossa geração pelo fato da existência de uma lacuna da liderança popular, foi ocupada por políticos destituídos de qualquer identificação com as verdadeiras causas do povo.
   Uma geração sem verdadeiros líderes transformou-se numa geração sem referências, cujo maior efeito em longo prazo foi a construção de uma consciência coletiva e imaginária acerca da política, como algo degradante,sobretudo, fora de nosso mundo. A substituição de verdadeiros líderes por “ratos de poder” acabaram com todo o simbolismo político acerca da discussão dos rumos políticos de nossa nação. A substituição dos líderes foi o primeiro grande passo dos militares, em seu projeto de poder, e o segundo foi muito mais cruel, quanto o primeiro, já que os grupos hegemônicos passaram intervir nos sindicatos, alterando as políticas educacionais, e conduzindo as massas para um mundo puramente materialista solidificando a sociedade de consumo.
  No plano cultural, os efeitos foram desastrosos, pois a juventude foi conquistada pelos efeitos da seleção de 1970, amplamente divulgada pela mídia, as canções de Roberto Carlos e The Beatles. As festas de arromba cantadas em conjunto dos iê iê iê  dos rapazes de Londres esconderam os gritos resistentes e “pouco a pouco” os verdadeiros referenciais foram substituídos por novos reis que surgiram: Rei Pelé e Rei Roberto. Não mais os velhos líderes sindicais,anarquistas, comunistas e etc.
 Os tempos passaram e as conjunturas desfavoráveis fizeram com que os militares e os grupos hegemônicos largassem o poder, diante de uma grave crise econômica todo o ônus da dívida externa, contraída por tais grupos, fora socializada ao cidadão, o mesmo povo que foi retirado das decisões políticas. Os efeitos drásticos em nossa economia e,sobretudo, os juros pagos ao FMI tornaram- se bandeira de uma nova ditadura econômica, desta vez orquestrada por antigos dirigentes convertidos ao neoliberalismo. O receituário para pagar as dívidas e conter a alta inflacionária foram apresentadas sobre a forma de vários programas econômicos que atingiram  em contrapartida,os direitos sociais. O desemprego, a falta de hospitais decentes, a precarização do trabalho e outras agressões foram realizadas por tais práticas políticas.
 Infelizmente não noto uma reação popular, apesar de indignados, pois, falta consistência ideológica para se organizarem e tomar o poder. Os três poderes não atuam de forma harmoniosa e constantemente vereadores e deputados trocam favores políticos com o executivo, pior, utilizam os nossos próprios recursos arrecadados por meio de tributos em suas campanhas políticas. Os jovens atuais não se interessam pelos principais assuntos do país,pois, são filhos daqueles antigos jovens que não tiveram lideranças e referencias políticas, assassinados, pela ditadura militar, pois, eles ouviam Roberto e amavam a seleção brasileira, sem contar que a Rede Globo de Televisão, filhote da ditadura, dava seus primeiros passos. Tais jovens, alienados, criaram seus filhos sem qualquer visão política e ajudaram construir essa mentirosa visão de que política é algo ruim e não presta, sendo que a própria política está presente em todas as relações sociais. Apenas são sombras daquele projeto político que apesar de tanto tempo é tão atuante e desafiador.
   Aqueles jovens tornaram se pais, mães e alguns já são avós.. E seus filhos?  Por tal fato, é importante que trabalhemos juntos para acabar com tal sombra que ainda paira sobre a consciência coletiva e não podemos esquecer, e precisamos acreditar nisso, que a natureza humana é maravilhosa e rica em várias potencialidades. O homem é um animal simbólico e portador de racionalidade, cabendo a nós, conscientes críticos, a tarefa de desconstruir a ideologia montada, e que nos faz tanto mal, há vários anos pelos grupos hegemônicos e que ainda persistem nos desafiando, nos afrontando, e ainda utilizam vários recursos tendo sempre como alvo o poder.
  Inclusive inventar a candidatura do palhaço carismático que na verdade, talvez sem saber, foi um instrumento criado pelo PR para materializar os seus próprios projetos de poder e assim se perpetuarem no poder.


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