Da
construída “aversão política” até a atual necessidade de conscientização de
grande parte dos brasileiros.
As eleições estão chegando, nas ruas e nos
comícios nada de novo, e o fenômeno tiririca ainda está presente no imaginário
inconsciente de grande parte da população; E não é nenhum exagero imaginar que
nada mudará em relação às eleições anteriores, dado que as maiorias das pessoas
não veem com a devida responsabilidade a validade do seu poder decisivo durante
as eleições. A inércia coletiva está pairada,
e muitos eleitores e até candidatos levam na brincadeira as eleições.
O fenômeno tiririca citado acima tem sido
explicado pela mídia como uma reação dos eleitores, entretanto, tal afirmação
esconde a verdadeira natureza do ocorrido, a qual o Partido Republicano
orquestrou com imensa sabedoria a candidatura do nosso querido palhaço
desempregado, que por sinal possui um grande carisma nacional e os seus votos
conquistados trouxeram para a legenda do PR a possibilidade de colocar
candidatos sem muitas chances de vitória. Se a votação, como afirmam, fosse uma
voz de protesto, certamente as pessoas não votariam no tiririca, até porque
quando o povo protesta de verdade, existe uma consciência política e uma
organização bem articulada, e tal fato não houve. Ou seja, foi muito mais uma
manobra inteligente elaborada pelos grupos hegemônicos, constituídos dentro do
PR, e conscientes da atual fragilidade política que a utilizaram como uma
ferramenta para o projeto de poder criado.
Por outro lado, identificar tal fragilidade
e associá-la à possível aversão política do brasileiro, me parece ser tão
absurdo quanto imaginar o voto de protesto referido. A tão comentada aversão
política referida não poderia encontrar eco em nossa natureza política, ou
seja, não podemos esquecer que os humanos são políticos por natureza e as
relações de poder atingem um universo tão dinâmico intrínsecos nas relações
sociais. Portanto, eu prefiro desconfiar
que a atual chamada “aversão política” está no interior de um jogo das
relações de poder construídas na formação do estado brasileiro e aprofundada
durante a ditadura militar (1964-1985), que ainda apresentam efeitos
merecedores da atenção de toda a sociedade organizada: escolas, igrejas,ONGs,
Clubes de Serviço etc.
Talvez não consigamos imaginar os brasileiros
discutindo nos bares, nas ruas, nas escolas, nas universidades, no trabalho e
etc. Se usarmos o atual quadro existente não acreditaremos que nas décadas de
40, 50 e 60 os populares se entusiasmavam com os discursos de Jânio Quadros,
Carlos Lacerda, João Goulart, Leonel Brizola, João Amazonas, Miguel Arraes e
Carlos Marighela e como também as lembranças de Getúlio Vargas. Os ideários dos
comunistas, anarquistas e das assembleias dos sindicatos combativos eram firmes
em sua ideologia. Independente do perfil ideológico presente em seus discursos
tais elementos acima descritos fez dessas décadas momentos riquíssimos de nossa
história política brasileira. Fizeram parte desse quadro político.
A ditadura militar representou os interesses
de grupos hegemônicos ligados ao capital estrangeiro, que não estavam dispostos
a entregar o poder ao povo e muito menos estavam inclinados a realizar as
reformas tão necessárias apresentadas pelo Plano Trienal do presidente João
Goulart. Temas como a reforma agrária tão necessária, a reforma urbana, reforma
eleitoral, a reforma tributária e a temida distribuição de riquezas propostos
ainda são temas “subversivos” mesmo nos dias atuais. Os temas enchiam o povo de
esperança e ao mesmo tempo assustava as classes conservadoras as quais jamais
abririam mão de seus privilégios e ,sobretudo, a crescente participação
política não era vista com bons olhos pelos conservadores, sendo assim uma
atitude teria que ser tomada, e tal atitude, veio como uma grande resposta: O
GOLPE DE 64.
No plano individual a ditadura se valeu de
várias ferramentas, elas poderiam variar conforme o perigo subversivo avaliado
por eles, ou seja, cada opositor ou grupos de opositores eram tratados de acordo com os seus atos
políticos contra a ordem instaurada pelos militares e lógico que poderiam
chegar ao extremo como por exemplo, a eliminação física. Escrever sobre os
crimes cometidos pela ditadura me renderia aqui escrever uma coleção de livros
e talvez não esgotasse palavras para descrevê-los, dado aos fartos testemunhos
e documentação histórica que comprovam os atos daqueles “bárbaros”.
Infelizmente nos dias atuais, apesar de tantos esforços, o Congresso Nacional
limita e muito o acesso aos arquivos confidenciais daquele regime protegendo
uma gama de políticos e militares associados.
Apesar de todos os brutais crimes os efeitos
da ditadura continuam existindo e se revelam na atual consciência política da
maioria dos brasileiros se materializam em nossa atual atitude cívicos como
eleitores. O maior legado dos militares não estão somente nos crimes, devemos
observá-lo de uma forma muito ampliada, já que o papel dos militares foi
neutralizar a participação política do povo brasileiro e tal situação implicou
na criação de vários instrumentos as quais viabilizassem os seus projetos
políticos, de maneira que foi necessário, eliminar fisicamente várias
pessoas,patriotas e lutadoras, que amavam e lutaram por esta nação, ou seja, os
militares e os grupos hegemônicos eliminaram fisicamente uma geração de
lideranças. Nos dias atuais tais situações ecoam em nossa geração pelo fato da
existência de uma lacuna da liderança popular, foi ocupada por políticos
destituídos de qualquer identificação com as verdadeiras causas do povo.
Uma geração sem verdadeiros líderes
transformou-se numa geração sem referências, cujo maior efeito em longo prazo
foi a construção de uma consciência coletiva e imaginária acerca da política,
como algo degradante,sobretudo, fora de nosso mundo. A substituição de verdadeiros
líderes por “ratos de poder” acabaram com todo o simbolismo político acerca da
discussão dos rumos políticos de nossa nação. A substituição dos líderes foi o
primeiro grande passo dos militares, em seu projeto de poder, e o segundo foi
muito mais cruel, quanto o primeiro, já que os grupos hegemônicos passaram
intervir nos sindicatos, alterando as políticas educacionais, e conduzindo as
massas para um mundo puramente materialista solidificando a sociedade de
consumo.
No plano cultural, os efeitos foram
desastrosos, pois a juventude foi conquistada pelos efeitos da seleção de 1970,
amplamente divulgada pela mídia, as canções de Roberto Carlos e The Beatles. As
festas de arromba cantadas em conjunto dos iê iê iê dos rapazes de Londres esconderam os gritos
resistentes e “pouco a pouco” os verdadeiros referenciais foram substituídos
por novos reis que surgiram: Rei Pelé e Rei Roberto. Não mais os velhos líderes
sindicais,anarquistas, comunistas e etc.
Os tempos passaram e as conjunturas
desfavoráveis fizeram com que os militares e os grupos hegemônicos largassem o
poder, diante de uma grave crise econômica todo o ônus da dívida externa,
contraída por tais grupos, fora socializada ao cidadão, o mesmo povo que foi
retirado das decisões políticas. Os efeitos drásticos em nossa economia
e,sobretudo, os juros pagos ao FMI tornaram- se bandeira de uma nova ditadura
econômica, desta vez orquestrada por antigos dirigentes convertidos ao
neoliberalismo. O receituário para pagar as dívidas e conter a alta inflacionária
foram apresentadas sobre a forma de vários programas econômicos que
atingiram em contrapartida,os direitos
sociais. O desemprego, a falta de hospitais decentes, a precarização do
trabalho e outras agressões foram realizadas por tais práticas políticas.
Infelizmente não noto uma reação popular,
apesar de indignados, pois, falta consistência ideológica para se organizarem e
tomar o poder. Os três poderes não atuam de forma harmoniosa e constantemente
vereadores e deputados trocam favores políticos com o executivo, pior, utilizam
os nossos próprios recursos arrecadados por meio de tributos em suas campanhas
políticas. Os jovens atuais não se interessam pelos principais assuntos do
país,pois, são filhos daqueles antigos jovens que não tiveram lideranças e
referencias políticas, assassinados,
pela ditadura militar, pois, eles ouviam Roberto e amavam a seleção brasileira,
sem contar que a Rede Globo de Televisão, filhote da ditadura, dava seus
primeiros passos. Tais jovens, alienados, criaram seus filhos sem qualquer
visão política e ajudaram construir essa mentirosa visão de que política é algo
ruim e não presta, sendo que a própria política está presente em todas as
relações sociais. Apenas são sombras daquele projeto político que apesar de
tanto tempo é tão atuante e desafiador.
Aqueles jovens tornaram se pais, mães e
alguns já são avós.. E seus filhos? Por
tal fato, é importante que trabalhemos juntos para acabar com tal sombra que
ainda paira sobre a consciência coletiva e não podemos esquecer, e precisamos
acreditar nisso, que a natureza humana é maravilhosa e rica em várias
potencialidades. O homem é um animal simbólico e portador de racionalidade,
cabendo a nós, conscientes críticos, a tarefa de desconstruir a ideologia
montada, e que nos faz tanto mal, há vários anos pelos grupos hegemônicos e que
ainda persistem nos desafiando, nos afrontando, e ainda utilizam vários
recursos tendo sempre como alvo o poder.
Inclusive inventar a candidatura do palhaço
carismático que na verdade, talvez sem saber, foi um instrumento criado pelo PR
para materializar os seus próprios projetos de poder e assim se perpetuarem no
poder.